Em algum lugar do principal distrito do mundo, existia uma Fábrica de Cerâmica que atendia no fornecimento de tijolos à região.Com solo rico em argila, aquela enorme Casa Grande e seus fornos artesanais fora um enigma para os moradores que necessitavam passar em ruas próximas, isolada de construções no entorno por conta, justamente, de recorrente aparições do Saci Pererê.
Acima, ao alto monte, o Governo Federal construíra uma escola técnica, obrigando a comunidade criar caminho de trilha ao lado da parte esquerda da cerâmica para os pais levarem seus filhos ao colégio. No período matutino, a atmosfera era positiva. Só se comentava sobre a lenda, mas ninguém se desafiava a conhecer o interior da fábrica de mais de um centenário de existência.
Ao por do sol, tudo mudava para aquela aldeia de moradores. O morro protegia a cerâmica da luz e a sombra encobria toda sua extensão antes do anoitecer. Era quando entre um e outra testemunha se apavorava em contar sua visão do personagem literário do Saci Pererê na entrada, única, do depósito das lamas formatadas para construção. Aparecia no portal como guardião.
Alguns professores, gente com maior intelectualidade, tentavam justificar a sincronia dos contos por várias pessoas diferentes sobre a mesma história. Afinal, qual a simbologia ou verdade sobre o Saci Pererê sair dos livros, amigo das florestas para morar e assombrar as pessoas naquela Cerâmica. Os pesquisadores autodidatas descobriram algo que poderia ter conexão.
E qual seria essa suposição? De fato, historicamente, antes da existência da cerâmica, aquela planície era um cemitério de escravos negros, remanescentes do pós-abolição. Ali, escravos de fazendeiros eram enterrados como indigentes. Mas, porém, o que o cemitério teria a ver com a figura imaginária ou não, do inconsciente coletivo, do Saci? Eis o mistério e a resposta a seguir!
A resposta tinha sentido quanto à origem do protagonista lendário e conexão com os escravos. O Saci, como todos sabem, é um tipo de sentinela das florestas, de uma perna só, fumando cachimbo e ostentava um gorro vermelho. A semelhança gerava uma remota possibilidade do motivo da aparição dele: o Pererê é negro. E matas densas não faltavam ao redor do povoado.
Nunca alguém contara que o Saci tivesse assustado os que o avistaram. Mas o ser humano é medroso por natureza. Só de ele estar lá, quando queria, em estado peralta, com sorriso maroto, apavorava. Supuseram que com avanço da selva de pedras, aos poucos, o Saci tenha decidido morar na Cerâmica para proteger e brincar, provisoriamente, e afastar ao anoitecer os intrusos, em carinho pelos ancestrais açoitados. Tem sentido.
A cerâmica fora demolida para dar lugar a muitas casas e ruas trançadas sobre as lápides inexistentes dos negros submersos metros abaixo do solo argiloso. Com a chegada do progresso, o século 21, o simpático Saci Pererê tinha suas estórias rareadas. Talvez sua missão ali já não fizesse mais sentido.
Ele, quem sabe, fora se apresentar guardião de outras ocultas terras que necessitariam dos seus préstimos de peraltice: cemitérios, celeiros, cerâmicas, em outras paragens, ou florestas, distantes da invasão dos espigões ainda mais assustadores até do que lendários e heróis sensíveis como o Saci Pererê! É possível! É possível!
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